Por Vinícius Félix
Don Tapscott é pianista. Toca desde os cinco anos e começou a se
esforçar de verdade aos 13, quando queria escrever canções de amor para a
namorada. Mas Tapscott não fez fama virando um mestre do jazz com seu
órgão Hammond B3. Preferiu fazer seu nome discutindo os impactos da
tecnologia e da inovação na economia e na sociedade.
Muitas vezes definido como cyber-guru, Tapscott foi considerado - com
certo exagero - pela revista Washington Technology (especializada no
setor de contratos com governos) como a pessoa mais influente sobre
mídia desde Marshall McLuhan. "Não uso esse termo, mas me considero uma
autoridade na área, faço consultorias para governos e empresários no
mundo todo", disse Tapscott durante entrevista. Ele esteve no Brasil há
duas semanas para participar da Campus Party, em São Paulo.
Já são 30 anos de carreira na área, cerca de 400 palestras nos
últimos cinco anos e 15 livros publicados. Seu maior sucesso é o
best-seller de 2007 Wikinomics - Como a colaboração em massa pode mudar o
seu negócio, traduzido para 20 línguas. Escrito por Tapscott e Anthony
D. Williams, o livro foi responsável por popularizar o conceito de como a
colaboração em massa pode reinventar a forma como as empresas se
comunicam, criam valores e competem em novo mercado global disseminado -
citando os exemplos do Myspace, do Linux, do Projeto do Genoma Humano e
do conceito da Wikipedia.
Em 2010, a tese ganhou uma sequência no livro Macrowikinomics, que
mostra a falência do modelo econômico tradicional, que tornou obsoletos
alguns setores. A proposta de Tapscott e Williams? Reiniciar tudo.
"A extensão da colaboração aumenta a cada dia. A reviravolta na
música e no setor de mídia será repetida em muitas outras indústrias",
disse ele à reportagem. "Uma reviravolta é iminente no ensino superior,
por exemplo. A abertura de cursos online tem se espalhado em todas as
instituições de ensino superior nos Estados Unidos." O livro foi
definido por Eric Schmidt, presidente do conselho do Google, como um
caminho para todos no futuro.
Como em toda sua obra, o livro revela um Tapscott otimista quanto ao
futuro - algo que ele carrega desde jovem. "Eu era idealista, queria ser
agente da mudança. Estava envolvido em várias causas sociais, como a
luta contra a guerra do Vietnã, o racismo e o sexismo", diz. Tapscott
acreditava que as mudanças seriam rápidas, o que não aconteceu, mas ele
compreende que algumas coisas mudam lentamente. E está na mão dos
jovens, outro público alvo de seus estudos, resolver isso.
Para definir a geração nascida entre 1977 e 1997, Tapscott criou o
termo "net generation" (geração em rede) em 2000, no seu livro Geração
Digital, que teve continuidade em 2008 com o livro A Hora da Geração
Digital. "São as pessoas que cresceram ‘banhadas em bits’ e têm o
cérebro diferente", afirma. Para ele o ponto chave para isso está no
período entre os 8 e 18 anos. É o momento, explica, em que o cérebro
humano é construído como a fiação e conexões sinápticas do cérebro.
"Minha geração passou 24 horas por semana olhando para uma televisão.
Hoje jovens gastam uma quantidade de tempo equivalente com as
tecnologias digitais, mas como usuários, organizadores, atores,
colaboradores", diz.
Tapscott explica que os games desenvolvem o pensamento estratégico e
trazem determinação, enquanto as redes sociais servem para a
colaboração. "Para os adolescentes de hoje, fazer o dever de casa é um
evento social que conta com a colaboração de SMS e do Facebook, enquanto
o iPod toca ao fundo."
Quando essa geração chegar ao poder, Tapscott prevê um mundo melhor.
"O principal interesse da geração conectada não é a tecnologia, mas o
que pode ser feito com ela", diz. "Eles são inteligentes, têm grandes
valores, sabem como usar ferramentas de colaboração e estão preparados
para lidar com muitos dos grandes desafios e problemas que a minha
geração está deixando como herança".
Abertura radical. Seu otimismo chega a outros campos. Usando o tino
de músico, ele acredita que local de trabalho dessa geração será como um
conjunto de jazz, "com os músicos improvisando criativamente em torno
de uma melodia e um ritmo", ao contrário do local de trabalho do
passado, que lembra mais "um exército marchando em sincronia militar".
Já na política, Tapscott vê que o resultado será um mundo menos partidário e mais preocupado com o consenso.
Em seu novo livro lançado em janeiro, Radical Openness (sem edição
brasileira), também escrito com Williams e baseado em uma palestra no
TED, essa visão do mundo ganha mais elementos.
Tapscott reafirma a importância da transparência das empresas e a
força da geração digital para um mundo capaz de resolver seus grandes
problemas. Os movimentos de liberdade de informação, como Wikileaks, vão
mudar a maneira que os negócios e a política são feitos.
O livro trata de quatro princípios: colaboração, transparência,
compartilhamento e o poder disseminado. Tapscott conta histórias como a
de um empresário que não conseguia encontrar ouro em sua mina. Anos de
trabalho e dinheiro gastos com geólogos terminaram quando ele resolveu
expor seu problema na rede e criou um concurso para premiar o projeto.
Uma empresa de computação gráfica encontrou o minério e levou US$ 500 mil - o empresário levantou US$ 3,4 bilhões em ouro.
O futuro não é a era da informação, mas da inteligência em rede,
defendeu o autor durante sua palestra na Campus Party. Tapscott elogiou o
evento e fez uma cobrança: "a Campus Party não é apenas o que você
pensa. É um ambiente que servirá de modelo para como problemas do futuro
são resolvidos no futuro".
O escritor não apenas defende a ideia, mas vive dessa maneira - é
presença constante no Twitter, mantém seu site atualizado com os textos
que escreve para jornais, tem um aplicativo para iPad e compartilha as
canções do pai, que foi compositor e músico. Praticamente um integrante
da geração conectada - porém com 66 anos.
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